sábado, 19 de janeiro de 2013

Copom mantém Brasil entre os cinco maiores juros do mundo


“...por um período de tempo suficientemente prolongado...”, diz a nota do Banco Central
Várias vezes a presidente Dilma – inclusive há poucos dias, a 27 de dezembro – frisou a necessidade de reduzir os juros até “um patamar compatível com o que é praticado internacionalmente”. A presidente relacionou essa necessidade a que “somos uma economia que pode caminhar pelos seus pés”, ou seja, relacionou a redução dos juros até ao patamar internacional com a necessidade do país de crescer.

No entanto, pela segunda vez, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) não baixou a taxa básica de juros. Pelo contrário, a nota emitida ao final da reunião, na quarta-feira, expõe que os diretores do BC, que formam o Copom, discutiram se aumentavam os juros ou mantinham-nos como estavam. Literalmente:
O Copom decidiu, por unanimidade, manter a taxa Selic em 7,25% a.a., sem viés. Considerando o balanço de riscos para a inflação, que apresentou piora no curto prazo, a recuperação da atividade doméstica, menos intensa do que o esperado, e a complexidade que ainda envolve o ambiente internacional, o Comitê entende que a estabilidade das condições monetárias por um período de tempo suficientemente prolongado é a estratégia mais adequada para garantir a convergência da inflação para a meta”.
Depois de tantos anos de privatização informal (e ilegal) do BC, já se sabe o que significam “riscos para a inflação, que apresentou piora no curto prazo”. Porém, a diretoria do BC tem noção do perigo – quem ia garantir a sua posição, se os juros fossem aumentados? Daí, foram mantidos em 7,25%.
No entanto, os “riscos” e a “piora” quanto à inflação, rigorosamente, são mentiras. Poucos dias antes, os mesmos sujeitos, em documento oficial, haviam dito exatamente o contrário:
O Copom destaca que o cenário central contempla evidências de deslocamento, para baixo, da taxa neutra [de inflação] nos últimos anos. Essa avaliação encontra respaldo nos modelos de projeção utilizados pelo Banco Central, bem como na dinâmica dos rendimentos de títulos – públicos e privados – sejam eles negociados nos mercados domésticos ou internacionais. O Comitê pondera, adicionalmente, que, na grande maioria dos casos, também apontam nessa direção variáveis mencionadas pela literatura como determinantes de declínio na taxa neutra”. (BC, Relatório Trimestral de Inflação, v. 14, nº 4, dezembro 2012, pág. 9 e pág. 80, grifos nossos).
A inflação, medida pelo IPCA, de 2012 (5,84%) ficou abaixo dos 6,50% de 2011. Portanto, a inflação caiu. A berraria da mídia, e de outros porta-vozes dos bancos, em torno de um suposto descontrole da inflação apenas porque ela foi de 0,6% em novembro/outubro para 0,79% em dezembro/novembro seria coisa de marciano, se todos não conhecessem a avidez por juros e pelo dinheiro do Tesouro dessa malta.
Há poucos dias, berravam pelo “superávit primário”, isto é, por aumentar o desvio do orçamento para os juros. Na quarta-feira pela manhã, berravam pelo aumento de juros – para que o BC não os reduzisse, o que conseguiram.
Não se trata de que estão recebendo pouco do setor público: nos últimos 12 meses, os governos federal, estaduais e municipais, e as estatais, transferiram aos bancos R$ 215,334 bilhões em juros – e isto porque essas transferências caíram R$ 41,912 bilhões em 2012. Além disso, de janeiro a novembro de 2012, somente o governo federal transferiu aos bancos mais R$ 282,356 bilhões em amortizações (um salto quase mortal em relação a 2011, quando essas amortizações, no mesmo período, foram de R$ 93,744 bilhões – portanto, as amortizações aumentaram, até agora, 201%).
Para que o leitor tenha uma ideia, no mesmo período, o governo federal liberou para o ensino superior cerca de R$ 15 bilhões (todos esses dados estão em dois relatórios: BC, Relatório de Política Fiscal, 28/12/2012; e Tesouro Nacional, Relatório Resumido da Execução Orçamentária da União e Outros Demonstrativos, nov/2012).
Ao não baixar os juros básicos – estão há 90 dias sem alteração – a diretoria do BC contemplou, precisamente, a malta financeira, a quadrilha da agiotagem. Uma taxa nominal de juros de 7,25% significa que os juros reais (o ganho dos banqueiros, descontada a inflação) estão em +1,7%, o que é, ainda, a quinta maior taxa do mundo. Enquanto isso, a média internacional dos juros reais básicos está em -0,4% (menos 0,4%). A taxa de juros básicos dos EUA está em -1,7% (menos 1,7%). Só há, portanto, quatro países em que os bancos e fundos especulativos norte-americanos, com a montanha de dólares que lhes forneceu seu banco central (o FED), podem ganhar mais que no Brasil. Aliás, não é bem assim, pois em quase todos os países os títulos públicos, ao contrário daqui, não são remunerados pelos juros básicos.
Não devemos, certamente, subestimar o que já conseguimos – a queda nos juros e a correção cambial, que são obras sobretudo da presidente Dilma. A questão é que os patamares atuais tanto da taxa de juros básica quanto da taxa de câmbio são insuficientes para que o país volte a crescer. Bem entendido, longe de nós a ideia de que nada é preciso fazer além de acertar o câmbio e os juros para que voltemos a crescer. Somente as aves do pau de galinheiro neoliberal são capazes de atribuir a outros essa ideia que  nunca houve – exatamente porque querem conservar os juros e o câmbio tal como antes.
Do ponto de vista do conjunto da economia, mantidos nesse nível os juros básicos, além de não forçar uma queda maior nos juros às empresas e aos consumidores por parte dos bancos privados (por que eles aumentarão a oferta de crédito ao público, se ainda estão ganhando cornucópias com os juros dos títulos públicos?), o BC mantém um câmbio evidentemente desequilibrado – isto é, a favor das importações de multinacionais, que tem seu preços subsidiados, contra a indústria nacional, que tem seus produtos encarecidos por um golpe cambial.
Economistas como o professor Yoshiaki Nakano defendem que a manutenção do câmbio com o dólar  ligeiramente acima de R$ 2 é insuficiente para atingir o que eles chamam “taxa de equilíbrio” - uma taxa de câmbio que não seja destrutiva para a indústria nacional. Por exemplo, diz Nakano:
“... as medidas de estímulos, a depreciação cambial e redução nos juros nem de longe conseguem compensar as perdas sofridas pelo setor nos últimos anos. (…) a taxa real de câmbio apreciada por longos anos promoveu a substituição da produção nacional pelas importações, desindustrializou o país, provocou enormes pressões de custos e reduziu a margem de lucro e o estímulo aos investimentos. (…) Qual o real problema que estamos enfrentando? (…) depois da segunda onda de desindustrialização, desde meados da década de 90, a manufatura anda com as pernas quebradas, mas não "moribunda". Tudo indica que o efeito da segunda onda será mais persistente, pois parte significativa das empresas brasileiras se transformaram em 'maquiladoras', ou simplesmente em importadoras, e de difícil reversão. (…) É preciso mudar toda a política para que se possa baixar os juros, manter uma taxa de câmbio melhor, ter estabilidade e gerar crescimento. (…) Enquanto o investimento público em infraestrutura ficar rastejando em torno de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) e a taxa de investimento da economia ficar abaixo dos 20% do PIB, vamos continuar nesta 'armadilha de baixo crescimento'”.
Isso é exatamente ao que a decisão do BC, de manter os juros básicos inalterados, se opõe.

CARLOS LOPES

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